Incentivos à Aquisição de um Veículo Elétrico. Sim ou Não? Eis a questão!

Artigo de opinião de Henrique Sánchez, publicado na edição nº 68 da revista Blueauto de junho de 2023, sobre as notícias sobre a possibilidade do Incentivo pela Introdução no Consumo de Veículos de Emissões Nulas no Ano de 2023 (VEN2023) poder terminar em 2024.


Henrique Sánchez
Presidente Honorário da UVE – Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos
Artigo Mensal de Opinião na Revista Blueauto


Têm surgido na comunicação social algumas notícias sobre a possibilidade dos Incentivos à Aquisição de um Veículo Elétrico poderem terminar em 2024.

Creio ser fundamental contextualizar e enquadrar o que temos atualmente, o que se pretende mudar e a posição da Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos (UVE).

  1. O que alguns membros do governo com a tutela da mobilidade elétrica referiram foi o fim dos Incentivos à Aquisição de um automóvel ligeiro de passageiros (tipologia 1 – categoria M1) 100% elétrico por parte dos particulares;
  2. A transferência da verba alocada a esta categoria de veículos para um subsídio ao carregamento dos veículos elétricos na Rede Pública de Carregamento;
  3. A justificação de que o atual sistema de Incentivos apenas abrange um número muito reduzido de candidaturas (1.300) face ao número de vendas de novos veículos ligeiros de passageiros 100% elétricos (10.405);
  4. A possibilidade de aumentar a verba atual alocada a esta categoria de Incentivos para um valor superior aos atuais 5.200.000€.

A UVE – Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos, já se pronunciou sobre este assunto. Cremos que uma das premissas utilizadas não tem fundamento, pois quando comparamos o total da verba alocada, 5.200.000€, dividida pelos 4.000€ definido como Incentivo apenas poder contemplar 1.300 candidaturas (5.200.000€ = 4.000€ X 1.300 candidaturas) com o número de novos veículos ligeiros de passageiros vendidos, 10.405 unidades, faria supor que a grande maioria das candidaturas não são contempladas.

Contudo, a realidade dos números é bem diferente. Em 2023, dos 10.405 veículos vendidos apenas 15% foram adquiridos por particulares (1.544), a esmagadora maioria, 85%, foram adquiridos por empresas (8.861), portanto sem sequer terem a possibilidade de se candidatar a este Incentivo, que é exclusivo para particulares.


Esta é a realidade destes primeiros quatro meses do ano de 2023, no entanto se analisarmos a totalidade do ano de 2022 o panorama é semelhante. Do total de vendas desta categoria de veículos (18.028) apenas foram adquiridos por particulares 2.879 viaturas, o que corresponde a apenas 16% desse mesmo total.

O principal fundamento para a alteração agora proposta não corresponde à realidade dos números, sendo que é possível abranger praticamente a totalidade das candidaturas propostas apenas com um aumento da verba alocada.

A verba necessária a este aumento da dotação financeira, pode ser obtida através do fim dos atuais subsídios aos combustíveis fósseis que ainda se encontram em vigor.

Claro que são importantes, muito importantes, os apoios às empresas, pois têm um impacto muito superior na redução das emissões do CO2 e dos gases com efeito de estufa, visto que os veículos comerciais circulam durante a quase totalidade do dia enquanto os veículos particulares circulam muito menos horas/dia.

O atual pacote de Incentivos para as empresas – Incentivos à Aquisição de ligeiros de mercadorias 100% elétricos (6.000€) e Benefícios Fiscais (Isenção do IVA e da Tributação Autónoma em sede de IRC) – é um dos pacotes mais atraentes atualmente em vigor nos países da União Europeia.

Acresce ainda o novo pacote, recentemente divulgado, de Incentivos à Aquisição de táxis 100% elétricos, num total de 250.000€, podendo em certos casos atingir um total de 16.000€ o valor do Incentivo por viatura.

Portanto em relação aos apoios à eletrificação das frotas das empresas, Portugal está na linha da frente, e bem, muito bem.

Portugal tem apenas 0.8% de quota de mercado no que se refere ao parque automóvel circulante 100% elétrico. Temos muito caminho pela frente e a atual emergência climática que atravessamos deve fazer acelerar a eletrificação dos transportes rodoviários e a descarbonização da economia.


Portanto, acelerar, acelerar, acelerar, a eletrificação dos transportes rodoviários, antes que seja tarde demais conseguirmos mitigar os impactos extremamente negativos com que nos vamos confrontar no futuro. Diria com que nos estamos já a confrontar. Podemos constatar nas notícias diárias sobre, por exemplo, os incêndios na Canadá, cheias violentas generalizadas, incêndios devastadores fora de época (Extremadura espanhola), seca extrema em várias regiões do Mundo, falta da água com consequências inimagináveis para os Humanos, etc.

Um eventual subsídio ao carregamento dos veículos elétricos na Rede Pública, além de ser pouco visível para os consumidores – poucos cêntimos por carregamento, ao contrário de um apoio imediato na compra -, poderia ainda vir a beneficiar veículos que além da motorização elétrica também possuem um motor de combustão interna. Estaríamos assim a deslocalizar apoios que apenas beneficiam veículos 100% elétricos para apoios que poderiam beneficiar veículos que também possuem motores que utilizam combustíveis fósseis – como os veículos híbridos plug-in.

Em conclusão o fundamento principal para esta alteração está baseado em premissas que não correspondem à realidade dos números.

Claro que devemos ir adaptando o atual sistema de Incentivos e de Benefícios Fiscais á realidade que se vai transformando. Uma das propostas da UVE, assenta, entre várias outras propostas que anualmente são entregues à tutela da mobilidade elétrica aquando da elaboração da proposta de Orçamento de Estado, baseia-se numa redução do preço máximo do preço do veículo proposto na candidatura, que é atualmente 62.500€, para um valor mais reduzido, o que viria a possibilitar que pudessem aceder ao Incentivo os cidadãos que mais necessitam deste apoio e também serem abrangidos os veículos mais económicos comercializados atualmente em Portugal.

Urge acelerar a eletrificação dos transportes rodoviários!
Urge acelerar a descarbonização da economia!
Não existe Planeta B!

Lisboa, 25 de maio de 2023
Henrique Sánchez

Consulte a edição digital da Revista Blueauto, nº 68

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